Antoine Lavoisier, o químico revolucionário que foi decapitado graças a disputa científica


Lavoisier mudou o mundo da química, mas acabou morto como um traidor do Estado durante a Revolução Francesa. 'Reinado do Terror: Um dos políticos da Revolução', em pé sobre uma pilha de corpos decapitados entre duas guilhotinas, bebendo sangue de um cálice e enchendo outro com o sangue da vítima recentemente decapitada Getty Images/BBC "Foi o suficiente para eles cortarem a cabeça, não será suficiente por um século para que outro igual surja", disse o matemático ítalo-francês Joseph-Louis Lagrange. Ele lamentava a decapitação de Antoine Laurent Lavoisier, que havia mudado para sempre a prática e os conceitos da química, forjando um sistema que daria ordem ao conhecimento caótico da alquimia. 5 experimentos de Darwin que você pode fazer em casa 5 experimentos simples para verificar que a Terra não é plana Lagrange e Lavoisier viveram — como Charles Dickens escreveu — naqueles que "eram os melhores tempos, eram os piores tempos, era o século da loucura, era o século da razão". Na verdade, era o século 18, o do Iluminismo e do "terror". Na França, foi o momento da Revolução que mudou o país e o mundo. E, naqueles tempos, apesar de suas realizações, Lavoisier tinha muita gente contra ele, além de um inimigo bastante poderoso. Um retrato Retrato de Antoine Laurent Lavoisier (Paris, 1743-1794), químico francês, com sua esposa, em 1788, obra de Jacques-Louis David (1748-1825) Getty Images/BBC Muitas obras de arte retratam momentos. Nesse caso, elas também mostraram um mundo que estava prestes a desaparecer. Produzida pelo artista mais ilustre da França à época, Jacques-Louis David, em 1788, uma pintura mostra Lavoisier olhando com adoração para sua brilhante mulher, Marie Anne Pierrette Paulze-Lavoisier. Em apenas alguns anos, David, um defensor da Revolução Francesa e amigo de Maximilien Robespierre (um dos líderes da Revolução Francesa), tinha controle quase completo das artes na França. E Antoine Lavoisier estava morto. Marie Anne estava falida, mas recuperou os livros confiscados do marido, editou suas anotações adicionais e as publicou uma década após sua morte. Casamento às pressas Antoine e Marie Anne se conheceram quando ela tinha apenas 13 anos e seu pai, Jacques Paulze, precisava casar a filha rapidamente. Uma baronesa insistia em fazer dela a esposa de seu irmão de 50 anos. Marie se recusou a se casar com aquele "tolo e ogro", nas palavras dela. Mas, na França da época, era difícil negar os desejos de uma baronesa. Só havia uma solução: ela não poderia se casar com o velho nobre se já estivesse casada com outro homem. Jacques Paulze tinha a pessoa certa em mente: um jovem bonito e brilhante que trabalhava em sua empresa. Ele se chamava Antoine Lavoisier. O jovem aceitou a proposta e, em uma grande cerimônia em dezembro de 1771, o vínculo foi formalizado. Naquela época, Luís 15 da França, conhecido como o "Bem Amado" e parte da Casa Real de Bourbon, estava no trono Getty Images/BBC 'Aquele jovem bonito e brilhante' Lavoisier já era razoavelmente conhecido na França, porque, além de um coletor de impostos, tinha estudado química. Naquela época, a ciência era quase sempre uma ocupação para homens que, embora tivessem outros empregos, tinham tempo e recursos disponíveis para se dedicar a ela. Por seu trabalho em geologia e seu plano de fornecer luz às grandes cidades, Lavoisier havia sido eleito membro da Academia de Ciências da França em 1768, quando tinha apenas 25 anos. Na década de 1770, ele fez seu trabalho mais brilhante, descobrindo como materiais, entre eles a madeira, são queimados. Na época, acreditava-se que, ao pegarem fogo, esses materiais liberavam uma substância misteriosa chamada flogisto (do grego flogistós: 'inflamável'). Dizia-se que essa era a razão pela qual um tronco diminuía de tamanho quando pegava fogo: o flogisto era liberado. Pensava-se que os materiais que queimavam facilmente eram ricos nessa substância. Não é bem assim que funciona, disse Lavoisier. Por um lado, quando os metais esquentam, eles não se tornam mais leves, mas mais pesados, disse ele. E ele argumentou que isso acontecia porque eles são combinados com um componente do ar: um gás que ele chamou de oxigênio. Lavoisier trabalhava em período integral, mas passava três horas pela manhã e três à noite fazendo ciência. E sábado era o seu dia favorito, porque outros cientistas e entusiastas frequentavam sua casa para discutir avanços e teorias. Getty Images/BBC Na década de 1780, Lavoisier usou sua teoria do oxigênio para construir uma estrutura completamente nova para a química. Ele esclareceu o que é um elemento químico: uma substância, disse ele, que não pode ser reduzida a nada mais simples. Ele compilou uma lista de nada menos que 33 desses elementos e desenvolveu métodos para dividir compostos químicos em seus elementos componentes e calcular as proporções relativas de cada um. Além disso, ele introduziu um moderno sistema de nomes que permite que as equações químicas sejam escritas em uma linguagem universal que seja entendida em todo o mundo. Lavoisier apresentou tudo isso em um livro de 1789, intitulado Traité Elementaire de Chimie (ou Tratado Elementar de Química), publicação que lançou as bases para o futuro desta área da ciência. Ele é considerado o pai da química moderna e dá nome à conhecida Lei de Lavoisier, ou Lei da Conservação das Massas, princípio de que nada se perde ou se cria (o conceito já havia sido apresentado antes por outro cientista, o russo Mikhail Lomonosov, mas o texto deste não repercutiu). Lavoisier foi um dos muitos pesquisadores intrigados com a composição do oxigênio e um dos primeiros a entendê-lo Getty Images/BBC Marie e Antoine Marie Paulze e Lavoisier pareciam formar um casal feliz desde o início do casamento. Embora isso não fosse tão comum na época, eles gostavam um do outro. Ela entrou com o marido no laboratório, aprendeu química, anotou resultados de experimentos e fez esboços de seu laboratório e equipamentos. Suas habilidades eram inestimáveis ​​para Lavoisier, especialmente sua capacidade de ler e traduzir, além de entender e analisar textos científicos escritos em inglês. Ele não foi o único a tentar resolver a química do ar e da combustão: havia outros atrás dessa "pista" envolvendo o oxigênio. Um deles era seu amigo, o químico inglês Joseph Priestley, que o encontrou primeiro e até isolou o oxigênio puro, que é misturado com nitrogênio no ar, mas pode ser separado pelo aquecimento de certos produtos químicos. Priestley notou que as chamas queimavam mais intensamente em oxigênio puro. Mas, na época, ele acreditava que o efeito era causado pelo ar deflogisticado — ou seja, ar havia ficado sem o chamado flogisto e tentava recuperá-lo de alguma substância em chamas. Existem historiadores que argumentam, porém, que o crédito é do químico sueco Carl Scheele, que identificou o oxigênio vários anos antes de Priestley. Infelizmente, uma carta que ele enviou a Lavoisier descrevendo seu trabalho nunca chegou e seu relatório científico foi esquecido por dois anos em uma gráfica. O fato é que o ambicioso Lavoisier queria estar à frente e precisava saber o que seus rivais estavam fazendo. No entanto, ele mal conseguia ler em inglês; portanto, sua esposa tinha que traduzir documentos nesse idioma para poder varrer o flogisto da teoria química e substituí-lo por sua teoria do oxigênio. Joseph Priestley encontrou e isolou o oxigênio; Lavoisier o nomeou e o entendeu Getty Images/BBC A história que passou por eles Foi então que a Revolução Francesa estourou, e aristocratas e cobradores de impostos foram considerados inimigos do povo. Lavoisier era as duas coisas e não se salvou, apesar de ser um cientista admirado e, em sua outra profissão, um dos poucos liberais que tentaram agressivamente reformar o sistema tributário. Segundo vários historiadores, Lavoisier foi denunciado pelo político revolucionário Jean-Paul Marat. Marat nasceu no mesmo ano que o químico, estudou medicina e viajou pela Europa. Na década de 1770, ele era um médico conhecido, que vivia em Londres e frequentava a aristocracia, embora já fosse politicamente ativo; em 1774, ele publicou Les Chaînes de l'esclavages (As Correntes da Escravatura, em tradução livre), atacando o despotismo. Em 1777, Marat foi para a França e atuou como médico do conde de Artis, irmão do rei Luís 16, que foi coroado como rei Carlos 10º. Praticar medicina com a aristocracia era lucrativo, mas Marat renunciou ao cargo para se tornar um cientista. Marat era um médico francês que fez parte da aristocracia em Londres e Paris, antes de decidir que queria ser um cientista. Mas ele é mais conhecido como jornalista e político durante a Revolução Francesa Getty Images/BBC O gérmen do ressentimento Confiante de que a Academia de Ciências de Paris, da qual Lavoisier era um membro proeminente, o reconheceria como um cientista de vanguarda, Jean-Paul Marat apresentou um ensaio sobre a luz, acompanhado por numerosas experiências, muitas das quais destinadas a invalidar teorias ópticas sobre a cor de Isaac Newton. A Academia Francesa nomeou uma comissão de cientistas, que incluía Lavoisier e também o então embaixador americano Benjamin Franklin, para investigar o assunto. Nove meses depois, a comissão concluiu que os experimentos "não provavam o que o autor imaginava que eles provavam" e decidiu que "eles não os consideravam adequados para a aprovação ou consentimento da Academia". As esperanças de Marat de ser aceito como um membro da academia desapareceram e foram substituídas por um profundo ressentimento contra a entidade e, particularmente, contra Lavoisier, o mais vocal dos membros da comissão. Mas ele não pôde fazer muita coisa até a Revolução estourar e se tornar um movimento poderoso. Foi então que Marat voltou-se contra Lavoisier, fazendo circular folhetos denunciando sua ciência, seu passado e todas as suas atividades. Marat adotou a filosofia de "se você não pode juntar-se a eles, melhor derrotá-los". Ele acabou liderando um movimento para dissolver a Academia de Ciências. Pouco a pouco, colocou seu partido e parte da população contra Lavoisier, no momento em que a Revolução começou a se tornar seriamente perigosa. Em 13 de julho de 1793, Marat recebeu a vista de uma mulher chamada Charlotte Corday, que alegava ter informações confidenciais sobre um grupo de girondinos em fuga, o que despertou o interesse de Marat. Os girondinos eram um ramo moderado de revolucionários que eram a favor da dissolução da monarquia, mas contra a liderança violenta que a Revolução havia assumido nas mãos dos jacobinos, como Marat e Robespierre. À época, um problema de saúde que causava extremo desconforto fez com que Marat improvisasse um escritório na banheira, onde o incômodo diminuía. Ao final da conversa, Corday, uma defensora secreta dos girondinos, inesperadamente pegou uma faca e a enterrou no coração de Marat. Dizem que suas últimas palavras foram: "A moi, ma chère amie!" ou "Para mim, minha querida amiga!" Corday foi presa e, apesar de ter se defendido dizendo que matara "um homem para salvar cem mil", ela foi condenada e morreu na guilhotina aos 24 anos. Como amigo íntimo de Marat e companheiro jacobino, o pintor Jacques-Louis David foi encarregado de planejar o funeral e pintar a cena de sua morte. O artista Jacques-Louis David retratou o momento do assassinato do amigo em 'A Morte de Marat' Getty Images/BBC O assassinato de Marat fez dele um mártir por algum tempo. Seus amigos e aliados mantiveram vivo seu rancor contra Lavoisier e o prenderam. Enquanto era mantido em cativeiro, Lavoisier escreveu a um primo: "Tive uma carreira decentemente longa e, acima de tudo, feliz. Acho que minha memória será acompanhada por alguns arrependimentos e, talvez, alguma glória. O que mais alguém pode querer? Esse assunto provavelmente me salvará dos inconvenientes da velhice. Eu vou morrer com boa saúde". Em 1793, o químico foi considerado traidor do Estado e condenado à morte. Em 8 de maio de 1794, Antoine Lavoisier foi levado à guilhotina. Embora seja uma história apócrifa, conta-se que, quando as realizações científicas de Lavoisier foram apresentadas como uma razão para perdoá-lo, o chefe da corte respondeu: "A República não precisa de sábios". 'Charlotte Corday', pintada em 1860 por Paul Baudry, quase um século depois do assassinato, quando Marat deixou de ser considerado um mártir e um herói; Baudry o pintou como um monstro zangado, e Corday passou a ser - entre os intelectuais - a verdadeira heroína da França Getty Images/BBC

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